Marcelo Novaes
A primeira palavra que me vem a mente ao reler esse poema foi: monstruoso. É uma palavra moderninha e como tal, idiota, mas foi o que senti ao reler essa maravilha.
Reza a lenda
[e deixa de ser lenda
quando se reza, porque
reza se torna] que Pitágoras
teve de pagar ao primeiro
aluno, para poder
ensinar a sua
arte.
[Mas Pitágoras era filósofo
e sua parte no lucro era outra:
Arte Oculta].
Reza a lenda
[e deixa de ser lenda
quando se reza, porque
reza se torna e em prece
e história se condensa] que
o muito saber não ocupa espaço,
só muito tempo e esforço: estilhaça o
corpo, às vezes definha, às vezes amassa.
Reza a lenda [e deixa de
ser lenda quando se reza, porque
se fixa na tábua do tempo como prego]
que Kafka teve apenas cinquenta leitores
em toda a vida e que Baudelaire ganhou
apenas dezessete francos por toda a sua
obra.
Reza a lenda [e a repete Gerardo
de Mello Mourão, bardo velho - e
porque a repete já é fato (velho bardo),
sobretudo porque a repete ouvida da fala
sofrida de amigo gago: esforço que sacraliza
a fala em oração perene e indubitável] que a
literatura é implacável e que só vale para dar
testemunho.
[O que já é muito].
Isso é o mesmo que quisera e dissera
outro que rezava lendas e causos em poesia
bem prosada e proseada, o velho e bom Guimarães Rosa,
que não escrevia pra ninguém nem pra alguém [nem nonada],
mas pro dia do Juízo Final. E só pra isso prosodiava o rapsodo
no lombo do mundo todo: O Único Sertão.
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