sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

OS OLHOS REAIS







Há algo de mim que não posso perder, não posse transigir nem negociar. É o que falo tanto e tento te mostrar, é sem explicação, sem coisa que se possa medir, calcular. Só pode ser estimada, nunca exata, nunca certa. Mas nem queria, nem quero que entendas, quero que sintas. Feche os olhos e olhe o que vê no breu, lá estão as coisas que te falo. Não são fúnebres, não são tristes, são o olhos que Deus deu antes de dar esses que chamamos olhos e pelos quais nunca veremos a Deus. 
É quando quero a paz, quando preciso não, quando a quero e busco por ela não por falta mas por razões de antanho, de quando o mundo era outra coisa antes de ser o que vemos.
O que vejo é dor e indiferença, gente sem poesia, poesia sem o sangue, sem o frêmito, sem o sangue, poesia sem a dor do parto, rasgando, chorando, nascendo. Eu não quero isso, esse mundo sem poesia, esse grito de dor. Eu fecho os olhos, tenho meu blog, tenho minhas imagens quando fecho os olhos, tenho a esperança  de valer a pena, de conservar o que sou com meus olhos fechados, com o fugir do mundo que há e habitar, ainda que por momentos, o mundo real.
No meu mundo de olhos fechados todo mundo é poeta, sem essa de escrever, que isso não serve  pra nada, só vivem como poetas, são homens como os  do mundo de olhos abertos, com todos os jeitos e vontades, mas não tem outro ideal que sigam mais que esse: amai-vos uns aos outros como vos amei.
O mundo anda mau, matam e sempre foi assim, mas no meu mundo de olhos fechados, visto com olhos que de tão sem luz podem ver a própria luz quando se faz.
No meu mundo de olhos fechados a menina não chora, o menino não ri do seu colega por este ter um defeito qualquer, nenhum pai bate em filho, não por serem pais e filhos, mas porque ninguém bate em ninguém.




quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

MEU GATO PERSA





Eu tenho um devoção pela poesia cabralina, um venerar como se  pode venerar quem não comporta veneração. João Cabral De Melo Neto, para mim o maior, embora isso não passe de opinião de devoto. João não me ensinou a escrever poesia, ao contrário, me distanciou do sonho de fazer poemas. Se não me mostrou como fazer, me mostrou como não fazer, e a isso sou grato. Comovidamente grato. Me ensinou que sofisticação nada tem de assunto ou coisa ou ser. Que antes de ser poeta tem de saber que poeta é mais uma sina que um dom. As coisas não são o que aparecem quando olhamos. As coisas aparentes são a anti-poesia, a coisa disfarçada do que é para esconder sua essência. Por isto, e só por isto, em tu vejo um gato persa. Se queres discutir se és ou não é indiferente, por razões cabralinas, as únicas que são razões puras, por absurdas, por inverossímeis. Se tu não és um gato persa, o gato persa não existe. Mas gatos persas existem, logo tu és um. Em tudo lembras ele, tanto quanto ele não pode ser parecido com si. Não me venha com razão, com coisas de lógica ou sentido. És meu gato persa e fim. Cabral, no "ferrageiro de carmona" solta essa bomba de beleza: "não até uma flor já sabida, mas se chega a ser flor, se flor  for a quem o diga" ès meu gato persa.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

NO COMEÇO E NO FIM








Eu tenho sonhos e teorias, e trago um rosto terno dos que viram a dor mas não embruteceram. Eu grito alto demais para ouvir-se no escuro, sonho o passado, vivo e lembro o futuro, sinto o que digo, calo o que sinto mais não sei dizer. 

Eu leio um verso antigo de um poeta hodierno, de um poeta amigo, que fala de um pai morto, que escreve na net como se em livro fosse, como memória dos grandes poetas, como resistência da poesia, como um Escudo, elmo e sombra, que permanece na minha antologia dos poemas, e refaz o laço do silício com o papel mofado.

Eu vivo disso, de coisas sentimentais e de admirar poetas, de olhar as coisas como que sentindo o duro de tudo acabar, mas sempre achando que só acaba amanhã, como um bobo que sabe que é bobo mas não pode ser de outro jeito, porque não pode estar em outro estado, como sou vascaíno, como sou branco.

Eu dou ao meu curso de vida o sentido que posso, não posso mudar o curso, posso achar graça nele, é tudo o que posso. E não quero tudo, não quero o mundo, quero um olhar bom pra que eu retribua a não me amesquinhe, saber terminar melhor que comecei, mostrar que aprendi. No dia de nascer chorei, no dia de morrer sorrirei.