quinta-feira, 19 de março de 2015

O AMOR E A MORTE


















Minha irmã liga e pede para eu baixar umas músicas que tratam direta ou indiretamente  de pai. Minha irmã anda preocupada com a idade de velho. Ele tem saúde e vitalidade incomum para seus quase 70 anos. Ele viverá anos e passará dos cem. Mas o que aflige minha irmã? a morte. Não há amor que não seja isso: medo da morte. Amar é sobretudo temer a morte. Amar e ter medo da morte. Amar é saber que um dia poderá se carregar meu pai. Mas como poderemos ? o peso dele é insuportável, o peso dele é algo que tememos carregar. O peso dele sobre o que ele abrange é devastador. "mas que seu filho eu fiquei seu fã" o verso é bom mas não diz tudo, embora eu saiba que nenhum verso diria tudo sobre o medo de minha irmã de perder meu pai. Não seria perder um pai, seria perder o refúgio que se busca no medo quando se tem com que se proteger. Um dia, se eu tanto viver e ela também, teremos de olhar a vida morta, a vida sem vida, teremos de dizer (aiiiiiiiiii) adeus a seu Luiz. O amor é triste, o amor é crepúsculo, o amor é duro.

A vida é composta de sons e imagens, de outras coisas mais ou menos que ficam na lembrança. A vida é foda!

Tá certo, o velho não é peru, morrerá quando chegar seu dia. Mas e dai? o que assusta é que haverá o dia. Isso corta a alma de minha irmã e a minha. É forte , saudável e poeta, meu velho, mas chegará o dia. O dia em que não acordará como acordaremos? ao não ouvir seus berros que outro som nos fará menos tristes? Onde sentiremos seu cheiro que impregnou tudo? Com quem se consolar que possa sentir  tanto quanto nós?

Então esqueçamos isso, irmã, e celebremos a vida dele. Celebremos a chatice e o estar-certo-sempre. Celebremos os chiliques, celebremos nosso pai. Nosso pai! Façamos o que podemos por ele em vida. O que podemos fazer por ele em vida é isso de agora, dizer que o amamos, amar esse amor desmedido e desprotegido.

O tempo levará ele, você e eu. Não se sabe para que serve o amor. Talvez seja para isso: temer a morte de um pai vivo. Amar tanto um pai que se tem medo de sofrer. Se ele for primeiro que nós, irmã minha, só você sentirá o que sinto, só eu sentirei sua dor. Será como se a vida ficasse mais dura, será como um  buraco negro, será como um deserto em  meio a desertos, só restará "aquela mesa"; só restará "o brilho dos olhos dele"; Só restará a lembrança do jogador mulherengo e responsável. Eu disse "só" mas é muito. Toda a riqueza do mundo não pode com o amor devotado por nós a nosso pai.

O tempo destrói tudo menos o que foi um poeta. No dia que ele for saudade a própria saudade sentira remorso e talvez o nosso choro faça a morte menos fria. Não digo que comova a morte a morte de meu pai, digo que lhe faça perceber (ainda que por fração de segundo) o que é o amor e o que ele pode.