domingo, 14 de agosto de 2016

No dia dos pais

Pai não cansa, não cessa, não morre, não falta, não silencia, não bate, não mede, não dorme até o abrir do portão.
Pai é bobo, pateta, palhaço, nunca otário. Nunca estará errado, terá sempre o melhor motivo.
Pai é o que não sabe amar  (quem sabe?).
Pai é o amor com pena, com dó das possíveis dores vislumbradas no futuro do filho. Pai é chato. Muito chato. Uma chatisse que, coisa estranha, será dor quando cessar.
Não pode um filho saber do pai se não for pai. Aliás, poder pode, mas nunca com o riso pateta de constatar como é ridícula a maneira de encarar ridícula as ridículas manias que seu pai tinha.
Pai é sol. Pai é vida. Pai é algo que se já não o temos perto, temos dentro.
Aos filhos que já não tem pais, meus sentimentos e respeito. Aos pais que perderam os filhos, meu silêncio. A dor de um filho sem o pai é a que mais temo. A dor de um pai que perde um filho é para além de mim, de meus nervos, de minhas conjecturas.
Pai é tudo, pai é porto.

O pai de Guimarães rosa, o pai de Goethe, o pai de Jesus, o pai do pitão, o pai do luizinho...  Não importa o que seja ou faça o homem, o que pense, seus critérios morais, seus medos. Quando se diz: PAI, diz-se muito. Iguala-se o humano e o divino. Quando diz-se "pai" se terá dito tudo.

sábado, 13 de agosto de 2016

O sonho do poeta





Sinto mais pesado um dos lados do meu corpo -que não morto de tudo está- e vivo ou sobrevivo em facas educadoras, em pedras, em cactus, menos no diamante, mais no pouco, no seco, no exato.
Entre coisas que desgastam, entre coisas que se acendem, bailarinas inflamadas, touros, pontes e sevilhas. 

Aprendo com suas touradas que a poesia está completa onde ela não foi sequer pressentida.
Que não havendo morte o que há é falta de vida. 
Aprendi e guardo comigo, que não provém a beleza da coisa em si advinda. Que beleza  vem (na poesia) não de do que é, mas de como é descrita. Poucas coisas são em si mesmo bonitas e encerram em si sua beleza. A lua, o mar, o sol. Não se há de escrever poemas que apenas disto tratem (para tal já existem os poetas de Carpina) nem se falará de musas e ninfas. Tem que extrair de onde é improvável, de onde  é impossível. Impossível é o que não pode amarrar o poeta, nem prender-lhe pelo rabo. Ao poeta tudo é lícito desde que não descambe para o feio. 

O pecado do poeta é o feio, o simples, o vulgar. Os lugares-comuns, a frase feita, o pensamento dos outros. Ao poeta é dado o direito de não ser bom poeta, não é dado o direito de querer fingir sê-lo.

O poeta não chora, ele soluça.
Ele não ama, ele, ele constrói o amor para que outros amem.
O poeta não dorme, ele morre e volta a ser quando acorda. 
O poeta não sente, ele arde.
A dor do poeta não cabe em sua lágrima, e isso o angustia,
A fome do poeta não cabe em seu estômago.
O riso do poeta é de que vive o mundo.
Que o medo do poeta nunca se concretize.
Que o sonho do poeta seja tão real que não seja mais sonho de poeta.