terça-feira, 2 de outubro de 2012

MEU OLHAR











Em toda modéstia ponho meu olhar desconfiado. Desconfio da modéstia como se desconfia de tudo o que é pensado. Só o burro tem certezas plenas, mas  suas certezas vem de não virem o outro lado. 

Em toda empáfia há de haver um descabido, um desmesurado, um Hitler, um abilolado. Um bufão pateta e bucéfalos a o exortarem, uma comédia de caricaturas, bobos tiranos e seus avatares.

Em tudo verdade tem de haver o avesso, sem que esse avesso venha ser a verdade, ou que o avesso desse aprofunde-o, alargue-o, pois  o  contrário do contrário não é contrário ao quadrado.

Em tudo que é luta deve haver um motivo, antes desse motivo a razão, e entre os dois a justiça, acima dela mais nada. 

Em nada faltará empenho sendo justo o alvitre. 
Em nada termina tudo, mas isso é o segredo: ir do nada ao nada e não matar, nunca matar.

Quero, como o poeta russo, meu direito ao espaço e ao tempo. Como Paulinho da viola, ser levado pelo mar, pois não eu que em mim navega, quem me navega... pois é.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O OLHAR QUE ASSUSTA







Eu não tenho medo das agulhas, de uma broca me perfurando o crânio, da sala e de não poder sangrar.  O meu medo é de ir com ele, no carro, de tentar sorrir, e desastrado, chorar.

Eu não tenho ânsias, nem vontades de atleta, nem aspirações demais. O que quero é sentar com ele, colocar minha comida, cortar minha carne, ai sim, olhar seu olhar.

Sem problemas com nada, com dores e risos, lutando com a vida. Mas uma luta igual, cara a cara, sem a covardia de hoje. Batendo apanhando, não só me defendendo, como tenho feito agora. Até que um dia chegue o dia, o dia de ir embora.

Ir embora com um riso dos que sabem que a luta é melhor que o resultado. Atravessar a ponte é melhor que ter chegado. O bom do jogo é jogar, o bom do rio é passar, o bom do feito foi o que levou a ele, não ele em si.

Tenho muitos medos, mas da cirurgia tenho vontade. Aguentei até aqui, aquentaria toda a vida o que tenho aguentado, mas viver é ambicionar, querer ir à frente, objetivar algo. Não querer o dos outros, isso é inveja. Quero só o que é meu, o que eu posso, sei fazer, quero de volto.


Ficar com dois furos na cabeça, acordado, falando enquanto um eletrodo me vai ao centro do cérebro não me assusta; e eu não sou o que se pode chamar corajoso, destemido ou coisa que o valha. Tenho medo de baratas, tenho medos primários. mas o que não pode uma barata, pode ele. O que nunca pôde   o mal de parkinson, pode ele. Ele é meu advogado, tive de assinar uma procuração.

Depois de mim, ninguém merece tanto quanto ele minha melhora. Depois de mim, a ninguém essa cirurgia será mais restauradora que a ele. Depois de tudo, ficará o amor da gente e as piadas. Estamos no meio ainda, eu e meu pai, eu e a vida.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

MARCELO NOVAES

Impessoal












Compromisso com a palavra,
ele sabe, agora, é cartaz jogado ao
chão, enquanto se espera a morte
de pai, mãe, tio.


Sentado em banco sem encosto,
ele parece invisível, embora medido
por crivo impessoal. Chama-se a isto:
anonimato.


Ouve os outros vaticinando
O Choque, a contragosto: a
Chegada de Ahasverus com
Olhos de Neón: Nibiru, Har
Megiddo, Harmagedōn.


Por estar quieto, pensam-no
passivo. Por estar calado,
pensam-no sem ouvidos,
ou desconhecedor dos
fatos.


Nada mais distante do
correto.


Ele não dirá que seu coração
pega fogo. Não dirá que o sangue
é límpido, quando escoado ou
escolhido.


Não fará sequer uma Ode a
Dioniso ou seus prepostos.
Também não mencionará
Apolo ou o Dístico de
Delfos.


Não invocará para si a força
de qualquer instinto. Não entornará
os signos, a título de Vulto. Não
proclamará impropérios,
nem se regozijará com
¡Exclamações ao
Avesso¡


Não dissertará sobre as tantas
beberagens e seus efeitos. Nem
proclamará a pele como único
rito.


Não vocalizará as vísceras,
nem citará Zaratustra ou
Cítaras.


Não se contará entre os Felizes.


Não se imaginará navegando
águas diversas, inauditas. Não
se dirá poeta.


Atravessará a estanqueidade das
coisas, pressupostas ou presumidas.


E nos olhos, residirá sua casa.


Levantado do banco sem encosto,
mal se aperceberão do ocorrido,
enquanto ainda discutirão O
Choque, a contragosto.


Pai, mãe e tio já estarão mortos.

domingo, 2 de setembro de 2012

O QUE POSSO E O QUE NÃO









Eu posso estar em um lugar como o que fui ontem, sem verdinhos, com poeira, jogar sinuca de forma canhestra em uma sinuca precária, com assuntos precários, uma coca gelada, um tremor que não cessa, um sorriso no rosto e todo amor pela vida.


Eu posso escutar o ruído do vento no nada, o som das dores mudas, o grito dos silêncios nos velhos tristes, não convictos das suas quase convicções.


Eu posso descobrir teu véu, teu corpo, como montar um cubo, como destruir um castelo, como entender os sem razão, como estar tenso e calmo como um ou outra coisa se precisa.


Eu posso te fazer rir, chorar, ponderar, crer, descrer, se abster, se acalorar, entender, duvidar, se negar, aceitar, com ou do que falo.


Posso ironia, choro, te dizer: amor. Depois mudar e te chamar megera, puta, leviana, indecisa, beata, diabólica, salgada, doce.


Posso estar aqui dentro de você.
Posso dormir, posso sonhar.
posso ouvir teu som, vislumbrar o bom na tragédia e descobrir no riso o pranto vindouro.

Posso estragar o teu futuro, comer do teu bolo. Posso mandar você à merda, depois vou junto. Não posso matar, isso não posso. Não posso perder a fé, disso preciso.
Não posso perder o amor, disso é que vivo.

domingo, 26 de agosto de 2012

CONVERSAS


Para Elaine




Para que serve amizade?
Talvez para isso: visitar uma amiga que não fala.
E o amor?
Esse não serve para nada.
Os filhos?
Servem para nos fazer cretinos.
A poesia?
Serve para tentar evitar o inevitável da morte.
Me prove o bom da amizade, do amor, de Deus e da poesia!
Não posso.
Por qual razão preza coisas inúteis e improváveis?
Não sei.
Seja sincero, ao menos uma vez!
Serei, mas só essa.

Deus, amor, poesia e amizade são inúteis e improváveis, concordamos. Mas...

Mas...?

Para que servem coisas úteis?
Você é quem deve dizer.

Não sei explicar.

Você é retardado?

Acho que não.

Você é medíocre!
E você decepcionante.
Esperava mais de mim?
Devo dizer que sim, o chamam gênio do mal.
Queres me ofender?
Quem sou eu...
Ridícula essa falsa modéstia!
Não fica bem essas excessivas exclamações, esses chiliques, essa coisa de mulher apaixonada, essa... bem... veadagem.
Quer mostrar superioridade?
Não posso estar por baixo.
Sou rei!
De algo que nem de algo pode ser chamado. Rei do frio, do vazio, do vácuo.
Quer me dar lições? convencer-me de luares?
Não, de modo algum, tenho de ir à casa de uma amiga recém operada.
Lhe perguntei para onde iria?
Só  se pode responder, nunca afirmar?
Não banque o esperto, você quis jogar na minha cara sua amizade, seu desprendimento, sua tolice.
Sim, estás certo.
O diabo pode estar certo?
Claro que sim. O diabo quase sempre usa a verdade.
E quando mente?
quando fala de Deus, do amor, da poesia e da amizade.
Posso saber porque?
Por não poder sentir.
Como assim?
Deus, amor, poesia e amizade, estão para você como o frio para o metal, como o silêncio para o som, um não pode afetar o outro, nem mudar-lhe, nem estar em sintonia. São dispares, diferentes, nem chegam a ser oposto. Não tenho pena de você, sequer você existe. Há um criador, quem destrói sou eu. Acabou a brincadeira. Diabos não existem, é somente nossa desculpa, para não pararmos as guerras, estuprar, mentir, roubar. Fazer o diabo. E quem sabe depois colocar a culpa em Deus.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

UM TEXTO SOBRE UMA MÚSICA GENIAL



















Não deveria escrever sobre meu pai, não deveria escrever sobre nada, ou deveria escrever sobre tudo. Gosto de escrever, gosto de mostrar sentimentos, gosto de ser chorão. Detesto coletivos. Gosto de pessoas, não de povo, nem aglomerados. Gosto de bitóia totóia, gabi, pedro, minhas duas irmãs, meu filho, um menina que não sei o nome, não de crianças. gosto de Marcelo, Cabral; Pessoa; Baudelaire; Manuel;Castro Alves; Vininha, não por serem poetas, mas por escolhidos por meu gostar. Não tenho "pais", tenho um pai. Só sei ser isto, só sei ser assim. chorando e sorrindo por nada, acreditando no bom que há de vir. Juro que engano o tempo, juro que não sinto ele passar, escutando vininha, cuspindo no pt, morrendo de noite, nascendo de manhã. Quem me vir triste se enganou, quem me viu burro, pegou a pior parte. quem me mensura com medidas mesquinhas eu as estouro, arrombo, sobro, alago. Me tenho por muito, sou fundo, não raso. Eu crio um filho, eu durmo eu acordo, eu vago no mundo, eu sano eu endoido. Eu beijo, eu mastigo, eu endireito eu entorto, eu semeio, eu dizimo, eu encolho, eu aumento, eu te miro, eu te cego, eu desprezo, eu contemplo. Eu inundo, eu deserto, eu não crio, eu invento. Eu não morro, eu vicejo, queimo, ardo, arrebento. Trago junto a mim os meu livros sagrados, os meu um mandamento, minha calma e tormenta, meus quereres, meus desprezos, minha angustia, meu prazer, minha toda poesia, meu dizer: é assim! meu escrever pra você, meu querer só pra mim.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O CONTADOR DO TEMPO

Eu tenho noção exata do que seja poesia. Eu não escrevo poesia. Não tenho nenhuma espécie de frustração. Por isso posso escrever que gosto sabendo-os o que são: bobagens, bonitas bobagens. Mas bobagens sinceras são mais comovente e do que pretender o que não posso. O nome do blog é "O ADMIRADOR" porque sei admirar. Mas admirar  é saber também desprezar, preterir, comparar, catar feijão, como disse João. Vai um  poema de Marcelo Novaes, que escreveu uma porrada de poemas, vai linkado o no nome dele os blogs nos quais escreveu. 






MARCELO NOVAES
















Eu estou sempre na grande escadaria.
Eu estou no barco de pau a pique, entre
as duas margens do Rio Pardo. Eu não
sou quente. Eu não sou frio. Eu aguardo.










Viro um copo de aguardente - num só
trago -, e te meço, de cima a baixo. Eu
não estou no topo, mas no meio. Não sou
vesgo, não sou torto. Nem, tampouco, feio.
Aciono teu medo por controle remoto, pois
já descobri o jeito.









Maneira estranha de estar no mundo, na
grande escada: distribuindo ervas e guirlandas.
Apontando estradas. Sempre com nova postura.
Muitas vezes, no agachado. Mas agora de pé, onde
me equilibro. Forte. Rijo. Forte demais pra pretender
só uma das margens do rio.











De onde estou - bem no meio -, eu reúno as duas.
Eu miro as margens, e as possuo. Comparo os passos
dos que passeiam dos dois lados. Conto sombras e
grãos de areia. Antecipo as correntes do rio com
meus olhos de vidro. Frios. Azuis.Um azul anil.











Se me olhar, de repente – à tua esquerda, nunca à tua
frente -, saiba: eu assobio. E acordo uma memória que
dormia em tua mente.











Eu estou sempre na grande escadaria. Não sou morno,
não sou quente. Pesadelo ou fantasmagoria. Não estou
no topo, mas no meio. E sei contar o tempo. Sem perder
segundo. E do rio - bem do seu meio -, eu sei o mundo.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

SE ACABAR DEUS FAZ OUTRO










Nem todo dia dá praia. 
Nem toda praia dá surf.
Nem todo frio cinzento,
nem todo gol é golaço.
Nem toda falta é vazio,
nem tudo sobrar, opulência, 
Nem toda morte é assassinato,
nem qualquer rezar, penitência.


Nem não faltar é sobrar,
nem aturar, paciência,
nem crescer é aumentar, nem conhecer ser ciência.
Nem dormir é descansar, 
não ser mal, benevolência.
Nem não ter pra onde ir é ficar,
nem todo sertão,  Gonzaga. 
Nem todo mesmo é igual,
nem todo igual aquela,
nem todo mar é só sal,
nem todo som reverbera.

Nem todo gato é bonito, 
nem todo lado é esquerdo,
nem todo amor é o meu, 
amor de choro, de enterro.

Nem todo pai é o meu, 
nem toda chuva me gripa.
Nem o bom é só seda,
nem o ruim é só chita.
Nem o mundo acabou,
nem acabará um dia.
Se acabar Deus faz outro, manda a gente de volta pra folia.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

CAETANO VELOSO










Caetano Veloso disse que deve-se adorar as gias (g ou j?) e as coisas que não são jias (j ou g?) A bíblia diz que javé não quer que se ame as gias, nem as coisas que não são jias, só a ele. Quem tem razão? Caetano, como não seria ele?! Não adoro humanos, admiro os que são talentosos, façam o que fizerem, ganhem quanto ganharem. Alguns os tenho como professores. Não adoro nada no sentido idiota que se dá à palavra na bíblia. Adorar como no sentido de redes sociais eu também não "adoro", gosto, amo, adorar não. Não que eu santifique uma palavra, mas exatamente pelo contrário, pela vulgarização que as palavras sofrem. É abominável essas super-super adjetivizações. O que pode ser maior palavra que defina o amor do que "amar"? nenhuma.  Então dá-se à um comportamento idiota de pessoas primárias, um sentido de super-amor. Adorar não é um super-mega-hiper-power, gostar, é se prostrar diante de deuses ou natureza ou coia que o valha. Amar já é o máximo, e eu amo quem tá fazendo aniversário hoje.
Pelos 70 anos dele, por suas canções, seu chorar na morte de Tom Jobim, por tudo de bom que ele é, beijo, Caetano, amo você.  Hoje é um dia bendito por ser dia dele, maldito. E não venha com essa de ele não tomar conhecimento de minha existência, de eu lhe ter tanto amor não correspondido, de amar sem sequer ter o amor enxergado. Quem nunca amou uma pessoa pela alma nunca amou nem pode ser amado.


SALVE CAETANO. SALVE, SALVE.






sexta-feira, 3 de agosto de 2012

OS GATOS SÃO "O CARA"













Vinícius De Moraes escreveu um poema sobre gatos, e quase o céu caiu em minha cabeça quando li. Disse "quase" porque uma vez ele caiu. Estava em pé, próximo da cama, e ao ler o último verso de "o ferrageiro de carmona", de João Cabral De Melo Neto,  caí sentado na cama. Dirão meus leitores mundo afora: (se vivemos em tempos imodestos, sejamos imodestos com força) você não está exagerando? não deixo-se cair gostosamente por estar ao lado de uma cama? fosse um precipício você cairia? mesquinharias! ninguém l~e poemas em precipícios, quando se está à beira de um, se está com medo suficiente para não querer saber de poesia,  ou ... porra, mas que diabos é isso?! voltemos ao Vinícius e os gatos. A certa altura do poema do vininha ele diz que nada se parece mais vivo que um gato morto. Faz tempo que li o poema e a frase não é bem assim, mas é nesse sentido. Os gatos são os caras. Os grandes gênios nunca tiveram gatos. Tinham medo do olhar dele. O olhar do gato é revelador, nos mostra como ele nos despreza. Goethe, quando escreveu o Fausto, deve ter olhado para si e pensado: tu és foda! o que te falta fazer mais? tivesse um gato próximo, o olhar do bichano diria a ele: idiota! 
A superioridade do gato não é advinda de sua argumentação, gatos não falam ( aqui só fica desinformado quem não vem) o olhar do gato é loquaz demais para ele precisar de boca e cérebro, mesmo Shakespeare, não teria argumentos contra os gatos, não por os gatos não poderem, mas por não quererem. Semana passada vi esse vídeo, quase morro de chorar (eu só não exagero, o resto faço) ao ver um gato sofrendo. Eu nunca tinha visto uma coisa tão pungente, tão dolente, tão...chega de rimas imbecis, vamos ao gato sofrendo.