sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

SEUS OLHOS, SEUS BRAÇOS.









Para que saibas que sou bom em me reverenciar e me acho no mínimo o máximo, mas nunca perdendo de vista minha pequenez, vai outro texto cabotino. 




Eu posso, como bailadora andaluza, acender-me, mas mais que ela, te acender.
Posso te fazer rir na tua dor, te fazer sentir um amargo no riso, como café adoçado.
Posso te fazer gostar de ser xingada, porque não é xingamento, é carinho em palavra contrária. Tu não aceitaria de ninguém, se eu não te chamar tu sente falta.
Eu posso te cantar Chico ou um outro, te tocar como só eu posso, onde fica teu nervo. 
Posso te falar as mesmas coisas sobre pontes, sobre a vida, sobre mim, sobre meu pai. Sempre se comoverás, e cada vez um pouco mais.
Posso te fazer sonhar quando tua realidade se impuser, ou rir do papagaio dado ou vendido. 
Posso ter na tua raiva um lugar garantido, mas não podes evitar minha voz, meu sorriso.
O tempo te fará esquecer coisas boas e coisas ruins, mas não de mim. Estarei em ambas, sou um princípio, nunca o fim. Um começo que se renova. Sabes do que falo, sabes o que sou. 
Sou fúria onde queres luta, calmo onde queres relva. Sou medida exata de tuas dores e risos, caibo em ambos, me abrigas no teu riso. Sentes minha dor, sabes de minha luta, me olhas com meu filho, e  te comoves com nossa guerra, com nossa xingação. Meu amor é tanto e me pesa tanto na carne que preciso amenizá-lo, por isso xingo quem amo, por isso jogo livros no chão. 
Poucas coisas me deixam mole, sem ação. Como que entregue, como em espirito, como se minha alma estivesse nua e fosse revelada. Aquele rio é isso. Não, não forço a barra, o rio é minha vida. Aquele rio, o capibaribe, não me arrasa pelo ser rio apenas, nem ser bonito, nem nada que possa atribuir-se a rios. Não, é onde o retirante ia se entregar, ia se matar. João não deixou. Eu amo joão e não quero saber de sua suposta frieza. João me ensinou que muita diferença faz entre lutar com as mãos e abandoná-las para traz. 
Mas aprendi o principal comigo, e por isso me gabo tanto, por isso não "sou um onda" como minha querida amiga, Elaine achava, sou  o mar todo. Quando o mundo foi ruindo eu chorei, choro quando quero, e amo até isso, mas sem me identificar com o que não seja o carpina dizendo ao retirante que os otários se entregam, os bons caem rindo, levantam gargalhando, ensinam com rispidez.
Não estranhe se você me sentir contigo mesmo eu não estando, ou lembrar de mim em coisas improváveis, inesperadas, e que talvez te irritem.
Costumo ficar no meu riso, no meu carinho, na música que você não conhecia, no poeta pobre que sou, no escrito brega e sincero, na noite que nunca viste, numa ponte que nunca estiveste, numa saudade do que não sentiste, saudade que só eu preencho, que não pode, como saudades outras, ser substituída por novo amor, lugar ou rima. Uma saudade permeada tão de mim, de meu jeito, e tão dentro de ti entranhada, que sentirias o meu cheiro ainda que sem o olfato.  Meu beijo ainda que sem  o paladar. O meu abraço ainda que sem o tato. Me verás com olhos fechados, e a cada lua que olhardes verás o meu riso.
Claro, sou uma merda humana e te farei lembrar de minhas mesquinharias, pequenezas, injustiças, de tudo que te fez ver que eu sou um ser como qualquer. Mas como vai esquecer daquilo? sim, daquilo! da noite que me conheceu. Vai tirar o bar de lá? Admita, você poderia ficar rica, comprar o bar e mudar tudo. Poderia ficar muito rica e comprar a rua, interditá-la. Mas para esquecer da comida não comida daquele bar, e de sua bebida não bebida, precisa mais que dinheiro, precisa não ser você.
Mas não só vaidade, sou todo e não metade. Não te dei o que te dei por bondade, ficou de você algo em mim. Se fosse por menos não seria o que foi. Me dizes ser eu sem coração, não, te enganas. Tenho o meu pulsando e grande, abrigando muita coisa, muita poeira e cansaço, mas dentre o muito guardado, estão seus olhos, seus braços.

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