sábado, 3 de março de 2012

OS PAIS DOS MENINOS IMUNDOS
























Tudo o que sei deste homem se resume a ser nome de rua e sua biblioteca. Na rua com seu nome vou de vez em quando, na biblioteca não mais. Conheço a cidade que moro, pequena e feia em sua secura agreste. Cidades como a minha só existem em sonho, ou bibliotecas. este homem, João Condé, doou sua biblioteca à cidade e eu pegava livros lá quando li a livros. Sua biblioteca era um sonho, ficava no meio da feira de caruaru, um lugar esquisito e bonito, e russo-agreste. Sempre lembro deste homem, deste grande homem, cuja cultura não vale nada em nosso tempo.


De fato, ando meio melancólico e sentimental, mas quem vive rindo de tudo o tempo todo, não é feliz, é só um pateta. Rimbaud dizia que triste era o riso dos ignorantes, estava certo. O riso só, sem razão, fora de proposito e hora, é execrável. Sim, é isso mesmo! só o canalha é plenamente feliz. Olhar para cima é uma maneira de ser canalha. Temos o lado. O lado é que fode tudo. No centro de minha cidade, pequena e feia, mas amada, como se pode amar uma mulher feia, vendo nela seus por-dentros, não  por-foras, fazendo com que os externos sejam bonitos por serem destoantes do bonito, contrapondo à beleza a si própria, contrária ao que em si é o mesmo. Mas de volta ao centro de minha cidade, há os mendigos na calçada, no noite, e com filhos imundos e perdidos. São 05:13 da manhã, o branco ressona e eu vou me deitar com ele e sentir o corpinho dele quentinho e coberto. Os menino imundos de rua serão pais de meninos imundos e sentirão o que é ver um filho sujo e com frio. 


Tudo é dor. 


Viva João Condé!


Que cada homem que passou em cargos de poder e que tenha roubado um centavo,  seja réu em juízo cujo jurado será o pai daqueles meninos imundos.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

SOBRE HOMENS E CALCINHAS






















Acordei com a macaca, sofrendo por tudo, sorrindo por nada. 
tentando entender assassinos e santos, os meses do ano e a proporção das formas perfeitas. O que faz o rosto de Felipe destoar dos outros rostos, sua arrogância charmosa ser quase um espécie de inteligência corporal. 
Cabral já disse que em densas noites tinha medo de tudo, de um anjo que é cego, de um outro que é mudo. Não tenho medos de espíritos, tenho de medos primários, como o do senador mais velho sendo ameaçado por um amigo de Lula.
Pode alguém achar que derramo água fora da bacia, ou um com mais delicadeza verbal dizer: esse pisa no tomate! mas vou cortando o barato, com uma pérola do cavalheirismo universal: Não como todas as mulheres do planeta por que elas não me dão bola nem Deus daria-me tempo. Então dadas as devidas explicações,  vamos aos fatos: Thiago Lacerda é bonito pra caralho! 
O cara é  lindo demais, e tem cara e jeito de homem. Felipe, o sobrinho de Elaine, é lindo, tem uma grande qualidade: a soberba, mas tem cara de adolescente eterno. Fabio Assunção é lindo, mas com cara de anjo. Tenho a impressão que não pode ser olhado sem pena, como um anjo, um São Gabriel transpassado, um ser quase divino, etéreo, alado. Com mais asas que braços, engendrando mais que se imiscuindo, insinuando mais que sendo claro, vislumbrando sem pôr a termo.


Alguns homens com jeito de homem eu acho só bonitos. Como se acha uma calcinha bonita, como se acha uma monalisa bonita, como se acha o bonito no oposto, no que não lhe traz prazer ao tato, mas chega a ser um prazer do tato do olho.


Me detenho na calcinha ou no que ela desencadeia. Coisas de antanho, brutais, primeiras. É como se melhorasse o brilho do diamante, desse curvatura a curva, fazenda-a curva ainda mais, não por curvatura de curvas normais, de estradas ou de vidas. Uma curva que de ser tão em si mesma, tão em si centrada, tão em si contida, que repete tanto o mesmo movimento, que passa a ser reta. A calcinha, não qualquer uma, Wando está morto e não pleiteio o lugar dele, é desencadeador já o disse de hecatombes. Não qualquer uma, não em qualquer mulher, mesmo as lindas de corpo, modelos esculturais, podem emprestas a uma calcinha um tom de vulgaridade. Mas a calcinha comprada com amor, escolhida como se escolhe um presente, para agradar ao ser amado (com a devida vênia de meu amigo morto) é coisa de o cara ficar velho, brocha, se esquecendo de tudo, mas não daquilo. E se te alegra te digo: o  fardo de ter memória  boa e-me pesado nessa hora. Sim, te apraz ouvir isso? sei que sim. Eu lembro de cada gesto, cada riso, cada olhar seu naquele dia. Você sabe, você lembra, você estava lá também. 


Não é saudade, é lembrança. Nosso tempo já era, e melhor foi assim. Mas lembrar é saber que existimos. Nada pode ser mudado, e o tempo revertido, isso é ótimo, mas quando quero lembrar de coisas boas que ficaram no passado, que nunca esquecerei, lembro de uma calcinha, ou por outra, lembro de uma mulher com uma calcinha que nunca vou esquecer, ou por outra mais: que calcinha que nada! lembrei hoje foi de você.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

EU SOU O MUNDO











Eu prezo o abraço, o ato generoso, o sorriso, o gato. Prezo os poetas, as putas, os veados. Os jogadores inveterados, os ateus, os incautos. A rima, o verso branco, o que se muda ou volta a ser o que nunca deixou de  ser, o abrigo dado, o beijo da prostituta nos pés de um homem sagrado. O esforço dos dedicados. A gravidez e o descanso, em ambos há um sorriso, um conforto, um fado. Fado bom, triste porém  animado- como explico isso?- é assim: ver pitocudo e saber que  talvez não o veja com cabelos esbranquiçados, sabê-lo perdido para o tempo, saber que o tempo dele é o meu, eternizado.


Eu prezo os que choram na igreja, os que choram no enterro, os que tem chorado. Cada dor de partida, cada suor derramado, cada conquista humana, não da razão -prezo-as também- mas a do aprimorar seu estado.  Prezo os sabem o que são e tem disso se orgulhado, José Wilker, Caetano Veloso,  eu e mais um bocado. 


Prezo os ricos que não são arquétipos dos ricos arquetipados, e os pobres de nariz empinado. Prezo a beleza que se esquece da sua potência- Padre Fábio- ou do forte que emprega o sorriso, um grosso que se faz gentil à passagem de um velha senhora, e diz gostosa a uma menina gostosa. Digo que saber por as coisas nos lugares é uma virtude das mais admiráveis: à nobre matriarca dá-se prioridade de passagem, a loira gostosa come-se com olhos, devorando a carne dourada, com mil idéias sobre marcas de biquíni, não do objeto, das marcas que ele deixa na pele.


Prezo o dia, a noite, o que é no meio deles. Orlando Morais, Chico Buarque, Lenine, Guimarães Rosa, e a minha alegria de viver. Prezo o tempo que foi, o tempo que virá, cada riso dado me lembro, e se gargalhei, lembro mais ainda. Prezo o dia em que morri, o dia em que tudo caiu, o dia da chuva rala, o dia em que pensei: vida oh, vida de gado. Nesse dia, foi na chuva, foi no choro nela, que aprendi o que tenho ensinado. É tão pouco, é tão simples, cabe numa frase de um canção de Zé Geraldo. Que na vida nada está perdido enquanto a sonho, enquanto houver um filho a ser criado.


Prezo o olhar de quem se compadece com a dor alheia, mas prezo ainda mais os que acham lindo o carro novo do vizinho. Prezo a poesia de  Marcelo Novaes, e tenho quase certeza de que ele escreveu um poema nesses termos, com menos derramamentos, mais recursos literários, muito mais bem escrito. Mas saberá ele, o grande vate, que não há plágio, nem bajulação babaca. Há admiração pelo poeta e apreço pelo amigo. Prezo o saber estar no lugar que me cabe, mas ocupando-o todo, usando-o no seu limite.


Prezo o desprezo às coisas desprezíveis que qualquer um teria com dinheiro, mas na sua aparência, nunca em sua profundidade. Os que nunca fizeram o que os outros queriam e depois constataram que a vida não é assim, que muitas vezes estamos errados. FHC, Roberto Campos, Darci Ribeiro. Prezo Tim Maia, as coisas opostas, não por serem opostas, mas pela razão de cada uma, seus motivos legítimos ainda que errados.


Prezo eu saber discernir o que pode e o que não pode ser  prezado, por motivos meus, por achar que é, por motivos mais nobres do que os que motivam os elogios do PT, e amizades de lula. 


Que diferença faz isso?
o que eu gosto ou desgosto mudará o mundo?
Baby. sabe o que é? ninguém lê o que escrevo- fazem bem- mas se o mundo não vai mudar por meus escritos, tanto se me dá. Porquê?
Porque sou o mundo, baby, nada existe sem mim ou existirá

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

SEMPRE









Há os bons, os médios, e os Chico Buarques. Há os feitos, as conjecturas, e os gols de Romário. Há os times, campeões, que só tentam, e o Vasco. Há os poetas, medíocres, bons, e Cabrais e Bandeiras. Há os que admiro, os que desprezo, os que venero. Há os momentos: de sofrimento, de felicidade, os no teu colo. 


Sempre há de haver, posto que vive nas eras insone e desperto, sempre à vista, nunca óbvio, sempre latente, nunca de fora, o Cristo sagrado, verdade amorosa, verdade da verdade. Insone e desperto, pungente e concentrado, seguido até por quem o tem rejeitado. 


Sempre existirão os amores, os horrores, e meu filho dormindo. Pais como eu, pais como tu, e o velho Luiz, que é amor até quando em fúria, até quando é triste.


Sempre há de haver um poema novo, um poema antigo, e eu os contemplando. Se for parnasiano, moderno, romântico, de cordel ou do que seja. Falando de amor, de um bêbado que copula, de um rio, ou de uma musa, haverá os que admiram, depois de mim, como os que vieram antes. 


Nunca cessarão as guerras, as brigas religiosas, os que roubam seringas de hospitais para dar a empreiteiras, prometendo desviar rios, ou rodovias inviáveis. Mas antes e depois deles hão de haver FHCs, dando fim a nulidades.


A mãe que joga o filho no lixo, a que tenta entender  o filho morto, e a que o tem no braço. O lado de fora, o de dentro, e o largo. As doenças, as vacinas, paliativos, curas, e o último suspiro. O primeiro choro, é o segundo, e o aprender com eles. Os professores, advogados, rufiões, e curandeiros. Os que aprendem, os que ensinam, os Shakespeare. Os  quentes, os frios, e os que Jesus vomita. Os que me emocionaram, os que me irritaram, e o Padre Fábio.




O que me assusta, me fascina, me incendeia, é que nesse "haverá" eu não "serei", ou serei em outro estado. Morto eu, tudo cessa? tudo será acabado?
não amor, isso não cessa, será revivido, será relembrado, em um amor do futuro, em um amor do passado.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

EMBRIAGAR-SE COM VINHO, POESIA OU VIRTUDE.














Liturgia das Horas Enfermas





MARCELO NOVAES








Eu te leio alguns apontamentos
que falam da vida de marginais
místicos e hereges.



Eu te leio
notas sobre a operária que
fabricava bombas que mataram
seu marido, convocado às pressas
para um confronto rápido.


10 dias.


Eu te leio sobre o submarino
afundado explodido implodido
em oceano amigo.


Eu te conto
sobre o namorado já-viúvo
-antes-mesmo-de-casado, que
joga a rosa branca sobre a Rosa
Maria, presa num túmulo
gelado.


Eu te falo de dois seres perdidos
atrás da fuligem que não se
desfaz e não se dissolve nem com
sabonete, o resíduo que se impregna
na pele no ouvido no labirinto e no
senso de equilíbrio, depois de um
dia na fábrica de tecidos, na
indústria farmacêutica ou numa
mina de minério fino.


Mercúrio.


Eu te leio alguns provérbios vindos
do sudeste de um país longínquo,
com a esperança que te soem assim
o mais parecido com a Paz Celeste
nunca vista nem adivinhada.



Eu te
apresento uns versos de Baudelaire
como ante-sala do paraíso, ou porta
de entrada para outro inferno que,
só por ser diverso, já te traz
alívio.



Eu te apresento a biografia de um
homem aparentemente comedido
e decoroso, pudico, que disparou
metralhadora assasinando colegas
que estudavam juntos para aprender
o mesmo ofício.



Eu te recito de cor
alguma passagem bíblica que mais
pareceria a confissão de um outro
assassino ainda mais perverso e
ufanista que o primeiro, mais longe de
Deus do que nós dois estamos dos ovnis,
e eles de nós.



E te recito outras
passagens e paisagens do mesmo
Livro que inspiraram homicídios e
incêndios, destruindo legados inteiros
de povos antigos não-cristianizados,
matando queimando convicções em
corpos transtornados e
contorcidos.




E te mostro trechos e comparo com
os discursos dos preclaros líderes da
Ku Klux Klan, acompanhados dos uivos
das multidões com seus slogans
avaros.



Eu te recito um obituário dos seres
que tiveram os crâneos fraturados
quando lhes caiu um obelisco muito
alto altivo, inaugurado em homenagem
a um demagogo baixinho, histriônico e
parvo: Hitler.



Eu declamo de cor os
Mistérios do Rosário escondidos atrás
de uma estante de livros sobre diretores
de cinema e artistas gráficos.



Não vale
nem adianta pedir emprestado os óculos
de John Lennon, nem experimentar um
ácido pra ficar mais
esperto.



As portas
da percepção estão fechadas aos viciados
em drogas aos astronautas químicos, aos
santos lisérgicos de olhos
arregalados. Alguns já estão mortos. Outros,
internados
em sanatórios, inválidos para aquele difícil
percurso de atravessar portais e umbrais
escusos, invalidados em seus discursos
descosturados porque desconexos,
porque
mais ricos em lapsos do que em



Melhor ficar com os reparos desabafos e
confissões de Oscar Wilde, crítico irônico
e raro. Ou com as estocadas de Bernard
Shaw, nesse sentido quase um irmão do
primeiro,embora mais caústico e
ríspido.



Eu te apresento, por fim, meu boletim
de ocorrência contra você, pelo atentado
violento ao pudor de tentar me ler sem
atentar para o tanto que se lhe dá, sem
que nada tenha de me pagar.



Estelionato.


Por fim [um segundo fim mais fim do
que o primeiro, porque mais
melodramático e
menos justiceiro], eu te canto parabéns com
a voz de Marilyn Monroe, quase
agonizando,
chapada, anulada em seu encanto pelo encan
-tamento que causava.



Eu te canto com voz
pastosa patetizada, infantilizada idiota,
como
cantou a coitada ao presidente
assassinado.




E
assino embaixo, pondo minha bela cara à tapa,
adivinhando teu semblante atônito e
estupefato.


BAUDELAIRE


EMBRIAGUEM-SE
É preciso estar sempre embriagado. Aí está: eis a única questão. Para não sentirem o fardo horrível do Tempo que verga e inclina para a terra, é preciso que se embriaguem sem descanso.

Com quê? Com vinho, poesia ou virtude, a escolher. Mas embriaguem-se.

E se, porventura, nos degraus de um palácio, sobre a relva verde de um fosso, na solidão morna do quarto, a embriaguez diminuir ou desaparecer quando você acordar, pergunte ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que flui, a tudo que geme, a tudo que gira, a tudo que canta, a tudo que fala, pergunte que horas são; e o vento, a vaga, a estrela, o pássaro, o relógio responderão: "É hora de embriagar-se! Para não serem os escravos martirizados do Tempo, embriaguem-se; embriaguem-se sem descanso". Com vinho, poesia ou virtude, a escolher.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

SORRI





Não existe nada que me defina melhor: sou a alegria!
Por hoje e talvez por uns dias me deixe ser triste. Não quero argumentos, quero colo. Não haverá choros, nem mágoas longevas. Mas deixe-me, calado como quem ora.
Confuso, mas sem medo. Triste, mas não de tudo. Não mudou nada, nem sumiu a esperança. Só há um desconsôlo, coisa pouca, de criança. Criança que quando quer algo não dado pede colo. O que tenho é meu e ficará. Essa dor não é minha, e-me estranha, vai passar.





quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

CANSADO DE SER O QUE É











É como se doer fosse bom, como se a dor apaziguasse. Escutar Gonzaga, assim de madrugada, com meu branco ressonando..., sei não, sei lá, sei de onde vim, não onde vou dar. 
Mas onde eu estiver, onde eu me achar, com noites ou com dias, agito ou calmaria, levo isso comigo. Levo como guia. O mundo que eu sonhei, o mundo que eu queria. 
O mundo seria noite, dormindo dentro do dia. O mundo seria meu, mas o repartiria. Mas só com quem me mostrasse o que importa na vida, o que não aprendi nos livros, nem camas, nem bares. Com gente como criança, onde o mal cansou dos seus males.
E não cansou persuadido pelo bem, ou cedendo pela razão. Cansou de ser mau por estar triste, por não ter paz no coração. Como eu estou, como as coisas estão.