Ela não pediu e eu não tinha que oferecer, mas disse que lhe
faria um poema. Não disse-lhe que bom, não poderia fazê-lo, mas saiba-o
sincero, saiba-o meu inteiro.
Resta a quem não tem o dom de dizer bonito, o dizer sincero.
Resta a quem não pode o diamante, oferecer o que lhe cabe.
Ela é o que eu não poderia ser; por ser mole, frouxo, por
ter medo de seringas e hospitais.
Trabalha tentando curar, diminuir dores, suturar, aferir
pressões, olhar no olho dos que tem tumores e não chorar. Não creio que ela seja de cristal e paire
acima das pequenas e comezinhas mesquinharias da vida. Ela é só ela. Não é
pouco! Tem coisas que uma mulher tem das quais não se deve falar sem
prudência; coisas tais que embasbacam,
embotam o bom senso. Se eu disser que eu não amei a minha tão
recente e pouco conhecida amiga serei omisso.
Ela me faz lembrar João Cabral e isso é um perigo. Com o
respeito devido ao gênio pernambucano e amado por mim, farei uma tentativa
canhestra de imitá-lo (aos que se apaixonam é dado o direito ao ridículo) no
nascimento do filho do carpina, os personagens do poema do João falam da
formosura de uma criança recém nascida; eu falo dela, e peço licença:
De sua formosura deixa-me que diga: é beleza como deve ser
beleza de mulher, feminina, escancarada,
que inerva, que faz do mais sábio um palerma e dos palermas desperta instintos.
É um beleza que tem gosto, em que há prazer em se gostar. O gosto pelo que se
olha, da fome que se tem ao olhar.
De sua poesia eu digo que não se pode conter, diminuir ou
abafar; Ela se mostra por si mesma, está onde ela está.
De sua gostosura, deixa-me que conte: ela é coisa que se
mostra gostosa sem se provar. Que vendo já sabemos onde a delícia esta. Como se
sabe gostosa uma torta de morango não comida, uma fruta madura que se sabe
doce, uma coisa que de antemão você senti o prazer das coisas gostosas.
Eu conheço quase nada essa menina. Ela é um mistério, ela é
minha amiga. Já digo que é minha amiga mesmo que talvez ela assim não considere
ou me queira; digo que é minha amiga, e que só não o será se não quiser ou se
eu a aborrecer. Iremos brigar como todos os amigos brigam. Talvez eu lhe faça
raiva, talvez nada seja amizade. Mas nunca me arrependo de minhas amigas, mesmo
as que se afastam, mesmo as que me tem rancor. Sou poeta ruim e ser humano em
tentativa de crescer. Muita besteira na minha vida, muito a me arrepender;
Para terminar devo dizer que ela se chama Sônia e isso me
faz lembrar de Dostoievski. Sônia tem seus pés beijados por Ralskonikov e
pedi-lhe que pare de fazer isso e se levante. Ele lhe diz: -Não beijei os seus
pés, beijei todo o sofrimento humano.
Isso é de um beleza brega e pungente. Sônia, minha amiga, é
sofisticada e linda, como uma canção de Jobim, como uma canção de Gonzaga, como
o rio capibaribe, como o espaço e seu nada. Como o pulsar dos amores, como o
meu pai traçando baralho, como uma missa católica, como o Rosa dos sertões,
como o olhar de Ricardo para Falstaff, como um clarão no breu, como se o bom se
achegasse. Como chuva e cheiro dela, como o riso escancarado, como o talvez que
vira fato, como o fato mudado, como a coisa que é bela sem porquês, sem razões;
as coisas que são lindas porque são, são lindas por fado.
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